À medida que os aplicativos de mensagens instantâneas se tornam ferramentas indispensáveis de comunicação, print screens de conversas, manifestações, ofensas, combinações e acordos passam a integrar, cada vez mais, os autos (físicos e eletrônicos) dos processos judiciais. Mas até que ponto um print screen serve como prova judicial?
Em primeiro lugar, não há qualquer dispositivo no ordenamento jurídico brasileiro que impeça as partes de juntar print screens nos autos. O art. 369, do Código de Processo Civil (CPC), oferece às partes o direito de empregar todos os meios legais, ainda que não especificados no Código, para provar os fatos em que se fundamentam os pedidos:
Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz. (grifei)
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A orientação de alguns tribunais
Mesmo com a disposição legal, alguns tribunais brasileiros não estão reconhecendo os prints screens como prova válida. Em decisão proferida nos autos do processo nº 1034955-78.2016.8.26.0002, envolvendo pedido de reparação de danos e discussão sobre atraso de voo, a magistrada Sandra Galhardo Esteves afirmou, em suma, que
a simples captura da imagem reproduzida na tela do computador (printscreen) não é suficiente à comprovação de que a decolagem era impossível na data e horário previamente agendados. – Sandra Galhardo Esteves (Juíza da 12ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP)
Já no processo nº 0301928-48.2016.8.24.0020, envolvendo declaração de inexistência de relação jurídica, o desembargador André Luiz Dacol decidiu que “a exibição de imagens de tela do sistema interno da apelante (print screen), por si só, não se constitui em meio hígido de prova capaz de demonstrar a contratação não reconhecida pela parte autora”.
Em decisão nos autos do processo nº 0010227-53.2020.5.18.0121, a desembargadora Kathia Maria Bomtempo de Albuquerque referiu que o print acostado pelo reclamante “não é prova capaz de derruir o documento juntado com a defesa”. No caso em questão, o reclamante apresentou um print screen sem contexto, prejudicando a prova.
Cuidados na hora de juntar o print screen
Os prints podem, sim, ser considerados provas válidas (art. 422, CPC)[1]. O ponto é que, nos casos referidos, as partes não tomaram as cautelas necessárias para realizar a captura técnica da prova. Tudo isso contribuiu para que, durante a análise do conjunto probatório, os prints fossem considerados inválidos ou, no mínimo, não convincentes.
Este texto pretende orientar o leitor para que tome as cautelas necessárias na hora de juntar um print nos autos. O ideal sempre é utilizar ferramentas específicas de captura técnica. Nunca é demais lembrar que, embora seja um método rápido de captura do que está presente na tela do computador ou do smartphone, o print screen é uma prova frágil.
O print screen, antes de mais nada, é um arquivo de imagem. E, como tal, pode ser facilmente adulterado, forjado ou manipulado. Hoje existem aplicativos como o WhatsFake, que permitem criar conversas falsas simulando a interface do WhatsApp. O app, disponível para o sistema Android, possibilita criar perfis de pessoas reais e iniciar um bate-papo falso.
O conceito do aplicativo, criados para estimular a “brincadeira entre amigos”, se disseminou rapidamente. Hoje já existem apps similares, como Fake Chat Maker e WhatsMock Pro, também para simular conversas falsas no WhatsApp, além do Telefun e do FunstaPro, que possibilitam criar conversas falsas, respectivamente, no Telegram e Instagram.
Além disso, um profissional com boas noções de design consegue recriar uma conversa com o mesmo visual do WhatsApp, do Telegram ou do Instagram. Seja por meio de aplicativos específicos, seja por meio de softwares de edição de imagens, é possível criar conversas que nunca existiram, para que pareçam autênticas aos olhos de quem enxergá-las.
Metadados técnicos
A juntada de um mero print nos autos, portanto, nada prova. Faltam elementos de segurança, como o isolamento. Faltam metadados técnicos, para que se possa saber quando o material foi coletado, por quem e de que modo. Tais elementos são essenciais para demonstrar a integridade do material e para que, se necessário, um perito possa analisá-lo.
Os metadados permitem “encontrar” novos dados para a prova e podem eventualmente embasar uma perícia. Além disso, o isolamento efetivo na hora da captura técnica contribui para aumentar a confiança em relação à prova produzida. Tal recurso evita manipulação antes; e a preservação em blockchain ou ICP/Brasil evita a manipulação posterior.
Ou seja, juntar nos autos print screens desacompanhados de metadados é apostar na sorte. Anexar prints sem utilizar ferramentas de captura técnica é correr riscos desnecessários de que o material seja invalidado pelo magistrado ou impugnado pela parte contrária. Agir de tal modo pode colocar em xeque um pedido ou mesma a liberdade do cliente.
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E se a parte contrária impugnar o print screen?
Suponha que você junte aos autos um print desacompanhado de metadados, e a parte contrária resolva impugnar o material. Conforme o art. 411, III, do CPC, considera-se autêntico o documento quando não houver impugnação da parte contra quem foi produzido o documento. O art. 422, do CPC, complementa a redação, nos seguintes termos:
Art. 422. Qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, a cinematográfica, a fonográfica ou de outra espécie, tem aptidão para fazer prova dos fatos ou das coisas representadas, se a sua conformidade com o documento original não for impugnada por aquele contra quem foi produzida.
§ 1º As fotografias digitais e as extraídas da rede mundial de computadores fazem prova das imagens que reproduzem, devendo, se impugnadas, ser apresentada a respectiva autenticação eletrônica ou, não sendo possível, realizada perícia. (grifei)
Ou seja, se a parte impugnar o print screen acostado aos autos, você deverá apresentar a respectiva autenticação eletrônica. Em síntese, caberá a você fornecer mecanismos para que o material possa ser autenticado. Mas como fazê-lo se você não há metadados? Como fazê-lo se você não tomou os cuidados de usar qualquer ferramenta de captura técnica?
Se você não tomar as cautelas necessárias, em suma, não poderá apresentar a autenticação eletrônica. Além disso, se a conversa original tiver sido removida, não será possível provar a autenticidade do print screen, tampouco se realizada perícia sobre a imagem. Em tais casos, provavelmente o magistrado invalidará a prova juntada nos autos.
Ferramentas de captura técnica
A boa notícia é que já existem soluções seguras de captura técnica de prova digital no Brasil. Com elas, os profissionais podem anexar aos autos não somente os prints screens do WhatsApp (ou outros aplicativos de mensagens instantâneas), como também os metadados técnicos, para demonstrar a integridade e anterioridade do material.
Só para ilustrar: a OriginalMy lançou recentemente a extensão de navegador (browser) PACWeb. O plugin gera um relatório em PDF com o link da publicação e a cópia do que está sendo apresentado na tela. O material coletado é então certificado em blockchain, sendo acompanhado de metadados técnicos, para fins de apresentação em juízo.
Outra solução relevante é a Verifact, Já escrevi neste site sobre a ferramenta, que facilita o registro de provas de fatos ocorridos na Internet. A Verifact emite relatório com assinaturas certificadas, carimbo de tempo (ICP/Brasil) e metadados técnicos. Sua plataforma possui isolamento contra fraudes comprovado por laudo independente e metadados.
Enfim, mesmo com entendimento contrário de alguns tribunais, é legal e juridicamente possível anexar prints screens no WhatsApp como prova judicial. O ideal, contudo, é realizar tal procedimento por meio de ferramentas específicas de captura técnica, que assegurem a coleta dos metadados, a prova de existência e a preservação de integridade.
Ao tomar tais cautelas, você reduzirá as possibilidades de que os prints sejam invalidados ou impugnados.
NOTA
[1] No processo penal, diante da presunção de inocência e do ônus da prova, a validade é de quem apresenta. A perícia ou a produção em conformidade são igualmente indispensáveis.
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